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Os 50 anos do 25 de Abril

Arnaldo Matos

A SITUAÇÃO POLÍTICA ACTUAL E AS NOSSAS TAREFAS

Informe à conferência de Jales

A questão da situação política actual no nosso país é saber qual o destino da revolução portuguesa, deduzindo-o do balanço das vitórias e dos reveses dessa revolução e das forças de classe que lhe subjazem e os explicam.
Muitas vezes, não se atenta suficientemente na transcendente importância que reveste para os comunistas a análise da situação política e até do momento político, em cada um dos períodos ou os pontos significativos da revolução no seu desenvolvimento.
Uma tal atitude é o resultado da influência nefasta dos pontos de vista revisionistas no seio do movimento operário e do movimento comun9sta, caracterizando-se, entre outras coisas, por um desprezo total pela política, considerada assunto próprio de intelectuais e de burgueses, por interpretações dogmáticas ou subjectivas da realidade e por uma incapacidade de actuar de forma correcta, no momento exacto e no lugar oportuno.
Um homem, com os olhos vendados, não consegue agarrar um pássaro. Porquê? Porque não conhece a situação: não sabe de que pássaro se trata, onde é que ele se encontra em cada instante, qual a velocidade, a direcção e o sentido do seu voo. Em consequência, não sabe que método vai usar par agarrá-lo, nem como aplicar os seus conhecimentos, a sua força e a sua sagacidade para vir a capturá-lo.
O mesmo tipo de problema se levanta aos comunistas na luta de classes, isto é, na luta política. Quantos camaradas nossos não agem como um homem cego que teimasse em querer capturar um pássaro?
O conhecimento da situação política actual habilita-nos a compreender a realidade e a decidir sobre os meios, os métodos e as medidas políticas necessárias para transformar essa realidade em nosso favor. Mas o nosso conhecimento exacto da situação política é ainda indispensável para correctamente podermos escolher os meios, selecionar os métodos e aplicar com êxito as medidas políticas que tiverem sido decididas.
Certos camaradas, por vezes, desesperam, porque as coisas não lhes correm bem, como eles pretenderiam. As massas não ocorrem aos seus apelos, quando eles desejariam; ou, então, irrompem impetuosas nas ruas, quando eles não esperariam. As massas organizam-se quando ninguém lhes diz nada; ou, então, resistem a deixar-se organizar, quando lho querem impor.
Onde residem as causa mais frequentes destes fracassos e desfasamentos? No desconhecimento ou incompleta compreensão da situação política real.

O traço característico da situação política actual é a crise do Poder.
Relativamente a esta crise do Poder, todas as demais questões que a situação política do Portugal de hoje encerra são questões inteiramente secundárias. Neste ponto estão, aliás, formalmente de acordo, tanto o proletariado como os diversos sectores da burguesia.
Que a burguesia está totalmente de acordo com o proletariado neste assunto, é fácil verificar. Não é o Presidente da República quem profere insistentes apelos à “ordem” e à sua “restauração”? Não é o primeiro-ministro indigitado quem repete os clamores de “autoridade” e “disciplina”? Não é o Chefe de Estado-Maior do Exército quem estima que a sociedade está “desestabilizada”? Não são unânimes Barreirinhas Cunhal, Mário Soares, Freitas do Amaral e Emídio Guerreiro em que é urgente reforçar a “autoridade democrática”? Exprimindo o sentir único de toda a classe dominante, não é o “documento dos nove” que fala expressamente em crise do Poder?
Toda a burguesia está de acordo: o problema é a crise do Poder. Todo o proletariado está de acordo: o problema é a crise do Poder. Nestas declarações separadas da burguesia e do proletariado se resume e se contém o único ponto de acordo – e, ainda assim, formal – entre as duas classes antagónicas, entre os dois inimigos mortais da nossa sociedade. Aqui começa e aqui acaba a unidade de dois pontos de vista contraditórios sobre a crise.

Come se define essa crise? A crise do Poder define-se pela sua instabilidade.
O povo assiste, já sem emoção, às danças e contradanças dos governos provisórios de coligação com o grande capital. Caiem ministros e chefes de governo como caiem marionetas ou moscas. Os ministérios promulgam leis que já não podem aplicar; e o povo aplica leis que ainda não pode promulgar.
As massas populares não esperam coisa alguma dos governos provisórios nem dos partidos da coligação governamental, os quais assinaram durante dezassete meses a sua falência política fraudulenta. Em compensação, as massas populares cospem o seu desprezo sobre a actividade desses governos e sobre os chefes desses partidos, muito em particular sobre os chefes do partido traidor de Barreirinhas Cunhal.
Residindo aqui o fundamento da crise do Poder e arrastando-se a actual crise política vai para dois meses, já não foi possível a nenhum dos partidos burgueses ou pequeno-burgueses acusar o proletariado ou o seu Partido de fautor ou causador da presente cise, como acontecera das vezes anteriores.
Muito melhor que os nossos argumentos, desmascarando as calúnias vomitadas sobre a classe operária e o MRPP nas crises precedentes – eles acusavam-nos de ser os causadores das crises – foi a riquíssima experiência política entretanto adquirida e assimilada pelo povo, que lhe demonstrou insofismavelmente não ser possível a nenhuma personalidade nem a nenhum partido provocar, por si só, uma única das crises, quanto mais seis que levamos já de contadas.
E provou-lhe, também sem equívocos, que os acontecimentos, não podendo ser obra exclusiva deste ou daquele partido, deste ou daquele político, o são todavia de leis e forças subterrâneas da Revolução, a existência e alcance das quais, apenas os oportunistas, conciliadores e filisteus estão interessados em escamotear.

Estamos a viver actualmente a sexta crise do Poder.
A primeira foi a crise do Poder fascista, derrubado pelo golpe de Estado militar do 25 de Abril. A segunda foi a crise da última semana de Maio desse mesmo ano de 1974. A terceira crise foi a crise do primeiro governo provisório de coligação, que levou à saída de Palma Carlos do Ministério. A quarta crise foi a do 28 de Setembro, que teve como consequência o despedimento do fascista Spínola do lugar de Presidente da República. A quinta crise foi a que provocou a tentativa abortada de golpe de Estado fascista-spinolista de 11 de Março e o contra-golpe social-fascista das onze horas da noite desse mesmo dia. Porém, a mais longa e a mais complexa de todas as crises é aquela a que estamos a assistir e que, a despeito de todas as “peripécias” políticas já verificadas, não se encontra de modo algum resolvida.

(2.ª Parte)

pctpmrpp

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