PAÍS
Uma importante manifestação dos professores portugueses
- Publicado em 14.07.2012
Teve lugar ontem, 12 de Julho, em Lisboa, uma manifestação nacional de professores de todos os graus de ensino, a qual teve um significado político muito relevante para o futuro da luta e das condições de vida e de trabalho deste sector profissional.
Numa altura em que as vozes mais oportunistas e retrógradas se empenham em difundir a ideia de que os professores não querem lutar e que estão dispostos a aceitar passivamente todas as malfeitorias que o governo e o ministro Crato sobre eles fazem abater, a manifestação de ontem, convocada pela Fenprof e apoiada por partidos, como o PCTP/MRPP e também pelo Sindicato Nacional do Ensino Superior e por organizações e movimentos que lutam contra a precariedade no trabalho, foi o mais cabal desmentido dessas posições de capitulação.
A própria Fenprof, a maior organização sindical dos professores, levou muito tempo até reconhecer que os professores não fogem à luta e sabem que Nuno Crato, se é diferente da sua antecessora Maria de Lurdes Rodrigues, é para pior. Efectivamente, hoje ninguém tem dúvidas de que ambos – Crato e Rodrigues, Coelho e Sócrates – queriam e querem uma escola em que os professores sejam reduzidos ao mínimo em número e ao máximo na carga de trabalho, em que todos os direitos lhes são sonegados, em que o direito dos alunos a um percurso de aprendizagens de qualidade é completamente liquidado e em que o objectivo da máxima produtividade empresarial, com a consequente e pretendida concessão a prazo da gestão das instituições educativas públicas a interesses capitalistas privados, se tornou no leitmotiv de todas as medidas decretadas.
Na manifestação de ontem estiveram presentes cerca de 25.000 professores. É um número ainda reduzido face ao universo de cerca de 220.000 professores de todos os graus de ensino, do sector público e do sector privado, e em comparação com as gigantescas manifestações realizadas em Março e Novembro de 2008. A convocatória da manifestação nas escolas foi muito deficiente e, ao contrário das de 2008, a mesma teve na sua origem apenas uma – se bem que a mais representativa – das organizações sindicais dos professores. No entanto, esta manifestação constituiu, sem margem para dúvidas, o início de uma ampla mobilização dos professores, a qual apenas pode ser eventualmente travada por manobras de traição do tipo das ocorridas em 2008/2009 por parte das organizações sindicais (Fenprof incluída), para as quais todos os professores devem estar alerta. Para pôr cobro a tais manobras há que estar ciente de que o objectivo central da grande mobilização que agora se iniciou é, inequivocamente, o derrubamento do ministério de Nuno Crato e do governo de Passos Coelho. Sem que isto aconteça, nenhuma das reivindicações específicas dos professores poderá ser alcançada.
O discurso do secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, proferido no Rossio, na concentração que antecedeu a manifestação de ontem, deve ser saudado pelo seu conteúdo e pelo que representa para a luta dos professores. Sem que esta apreciação envolva qualquer espécie de ilusão e tibieza sobre a necessidade de denunciar prováveis tergiversações futuras por parte da direcção da Fenprof, cumpre assinalar os pontos do discurso de Mário Nogueira que os professores lhe deverão permanentemente cobrar no decurso dos grandes combates que terão de travar daqui para a frente.
O secretário-geral da Fenprof defendeu – e bem, embora não exactamente com estas palavras – que o objectivo da luta dos professores é precisamente o de derrubar o governo Coelho/Portas e o ministro Nuno Crato (“correr com a canalha que nos governa, sem demora e quanto mais depressa melhor”, foi a expressão a propósito utilizada). Por outro lado, na lista das principais reivindicações específicas dos professores, Mário Nogueira colocou à cabeça – e bem – a vinculação imediata dos professores contratados e a atribuição de componente lectiva a estes e a todos os professores do quadro, sem excepção. Outro ponto importante do discurso aqui em análise foi a afirmação clara de que esta manifestação marca o arranque de uma fase de mobilização intensa e massiva dos professores, para a qual foi dito que haverá, por parte da Fenprof, iniciativas permanentes (mesmo no período de férias escolares) que aprofundem e radicalizem essa mobilização. Finalmente, Mário Nogueira aludiu aos “erros” da Fenprof em lutas passadas e à disposição de os evitar no futuro. Não se sabe a que “erros” se quis referir o secretário-geral da Fenprof, mas aquilo que se exige da organização que dirige é que seja consequente na luta, que não troque os objectivos da mesma por qualquer negociação sem consequências práticas e que não vacile (como aconteceu em 2008) quando a questão do derrubamento do ministro e do governo se colocar – como irá certamente acontecer -, como passo incontornável para que a escola pública se afirme como esteio de uma educação democrática e de qualidade.
A luta dos professores é uma componente importante da luta de todo o povo trabalhador contra o governo de traição nacional PSD/CDS, pela expulsão da tróica e por um governo democrático patriótico. Como acontece com as demais lutas sectoriais dos trabalhadores, a obtenção de qualquer reivindicação específica dos professores pressupõe uma tomada de posição clara de recusa da chantagem da dívida pública. Sem tal recusa, nenhum objectivo pode ser alcançado. “Não pagamos!” uma dívida que não foi o povo que contraiu nem o foi em seu benefício – é este também o lema que deve nortear o combate político dos professores em defesa da dignidade da sua profissão e por um programa de efectivo desenvolvimento e melhoria da educação pública em Portugal.