PAÍS
O COSTA E O BES
- Publicado em 01.08.2014
Em 2004 foi inaugurado na Luz o novo quartel do Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa, em cujas instalações funcionam também o próprio Museu do Regimento e, desde 2010, a chamada SALOC-Sala de Operações Conjuntas do Município (verdadeira Central de Comando de todos os Serviços de Protecção Civil do concelho de Lisboa) e ainda uma sofisticada e valiosa (de meio milhão de euros!) Central telefónica conjunta da PSP, da Polícia Municipal e da Protecção Civil, tudo equipamentos vitais para Lisboa e para a sua segurança, situados num ponto estratégico da cidade e valendo qualquer coisa como 12,3 milhões de euros.
Em 2007, ou seja, três anos depois, começou a funcionar no lote ao lado do quartel de bombeiros o Hospital da Luz, propriedade de uma das empresas do Grupo Espírito Santo (a Espírito Santo Saúde) e projectado pelo Arquitecto Manuel Salgado, braço direito de Costa, vereador do pelouro do Urbanismo e Planeamento Estratégico da Câmara Municipal de Lisboa desde 2007 até hoje, tendo mesmo sido Vice-Presidente da Câmara entre 2009 e 2013, e que é simultaneamente primo direito de Ricardo Salgado.
Em 2010, pela primeira vez, responsáveis da Espírito Santo Saúde manifestaram a intenção de extensão ou expansão do Hospital da Luz.
E em 2012, o Presidente Costa mandou proceder a uma avaliação do lote municipal onde se encontra o Regimento de Sapadores Bombeiros, avaliação essa encomendada e levada a efeito no expresso pressuposto de que, com as futuras alterações ao Plano de Pormenor do Eixo Luz-Benfica que Costa, Salgado e Companhia já então se preparavam para fazer passar mas que ainda não tinham sido aprovadas, seria possível ali edificar a enorme área de 29.164 m2 de construção, sem qualquer especificação de uso!
No princípio de 2014, ou seja, com os donos do BES e respectivo grupo a perceberem que os buracos decorrentes das suas trafulhices e irregularidades estavam cada vez mais a descoberto e a sentirem imperiosa necessidade de alguma liquidez para as procurarem disfarçar, tornaram-se conhecidas a busca cada vez mais premente de um comprador para o Hospital da Luz, o que quer dizer sobretudo das suas instalações, dos seus equipamentos e dos seus terrenos, bem como as tentativas de procurar valorizar o mais possível o objecto do negócio.
E é assim que, em Fevereiro deste ano, a também falida Espírito Santo Saúde - mostrando claramente que já dava por certo o negócio - anuncia publicamente que iria "aumentar em 20% a área construída do Hospital da Luz com um investimento de 60 a 70 milhões de euros até 2018"! Isto - note-se bem - quando Costa, Salgado e Companhia ainda não tinham aprovado formalmente a revisão do referenciado Plano de Pormenor, mas também quando já desde Novembro de 2013 o chamado "Relatório dos trabalhos de revisão do Plano" referia, na sua pagina 103 e como foi entretanto noticiado publicamente, que "em área reservada a equipamentos, embora não conste da Programação de Equipamentos em Plano Director Municipal," passa a estar prevista "a construção de uma extensão do Hospital da Luz, com a demolição das actuais instalações do Regimento de Sapadores Bombeiros" (sic), esclarecendo-se ainda que a superfície máxima a construir seria "de 29.164 m2 num edifício de entre 6 e 10 pisos".
Tornou-se absolutamente evidente que aquilo de que se tratava, e trata, era de, à custa de um equipamento urbano novo, estratégico e absolutamente vital para a segurança da cidade, viabilizar a entrega de um bem valiosíssimo (terreno com quase 30.000 m2 de área de construção e sem nenhuma restrição ou especificação de uso) e com ele sobrevalorizar os activos do Grupo Espírito Santo, que assim, ao vender o Hospital da Luz, já poderia também, conjunta ou separadamente, vender o dito bem.
O negócio tornou-se, porém, tão escandaloso e tão escandalosamente evidente que, na versão final do dito Plano Pormenor, aprovado por Costa e Salgado, mantendo embora tal negócio, o respectivo texto contém tão cirúrgicas quanto significativas alterações. E assim, em vez de demolição das actuais instalações do quartel de bombeiros, passa agora a referir-se o eufemismo de uma "eventual transferência" para outro local, e onde se falava expressamente em "extensão do Hospital da Luz" fala-se agora meramente em "extensão do equipamento existente".
E, mais, depois de Salgado ter relembrado que tal extensão era uma "pretensão pública por parte dos responsáveis do Hospital da Luz", já em Julho deste ano de 2014, e já depois de começar a rebentar o escândalo das falcatruas do Grupo Espírito Santo, o executivo camarário de Costa aprovou, entre outras, a hasta pública da alienação daquele bem do património municipal, suprimindo tão cuidadosa quanto significativamente qualquer referência expressa ao Hospital da Luz, numa desesperada tentativa de ocultar que se tratava, e trata, de um negócio já perfeitamente previsto e delineado com o BES e o seu Grupo, e destinado ao aumento e valorização do património da Espírito Santo Saúde.
Mas há mais ainda! É que, de acordo com a referida decisão do Executivo do Costa, o valor-base da venda é de 15,8 milhões de euros, sendo que, ao preço da venda haverá ainda a deduzir um "desconto"(!?) de 10% em caso de pronto pagamento, pelo que o Município nessa hipótese apenas receberia 14,22 milhões de euros.
Temos assim que - para mais tratando-se de serviços e equipamentos que, como bem notou Fernando Curto, Presidente da Associação Nacional dos Bombeiros Profissionais, não podem ser "levados ao colo" e cujo preço de realojamento (que Costa e Salgado se recusam a divulgar) será elevadíssimo - o município de Lisboa dirigido por Costa aceita, a troco de 14,2 milhões de euros pagos imediatamente ou 15,2 milhões pagos diferidamente, entregar um terreno cujo valor de aquisição não será nunca inferior a 12 milhões de euros e destruir equipamentos que estão avaliados noutros tantos 12,3 milhões de euros, sem sequer ter definido ainda e ter anunciado à cidade o novo local para o quartel dos sapadores bombeiros de que vai dar cabo!
Em suma, com Costa na Câmara de Lisboa, o património e os equipamentos municipais servem é para propiciar negociatas e para procurar salvar os negócios dos seus amigos do BES. E as sucessivas manobras consistentes em cirúrgicas alterações dos textos e documentos por forma a ocultar a identidade dos verdadeiros beneficiários da negociata destinam-se, apenas, a enganar o Povo. E um Presidente da Câmara que engana ou colabora em enganar o Povo deve ser imediatamente demitido! E, mais ainda, mostra que se Costa chegasse a Primeiro-Ministro seria, tal como Seguro, um verdadeiro desastre para o País!
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