PAÍS
- Publicado em 22.12.2023
O que um operário consciente nunca esquece
"...o próprio desenvolvimento da indústria moderna contribui forçosamente para inclinar cada vez mais a balança a favor do capitalista contra o operário e que, em consequência disso, a tendência geral da produção capitalista não é para elevar o nível médio dos salários mas, ao contrário, para fazê-lo baixar, empurrando o valor do trabalho para, mais ou menos, o seu limite mínimo. Porém, se tal é a tendência dentro deste sistema, isto quer dizer que a classe operária deve renunciar a defender-se contra as usurpações do capital e abandonar os seus esforços para aproveitar todas as possibilidades que se lhe ofereçam de melhorar pontualmente a sua situação? Se o fizesse, ver-se-ia degradada numa massa informe de homens famintos e arrasados, sem possibilidade de salvação. Creio haver demonstrado que as lutas da classe operária em torno do nível de salários são episódios inseparáveis de todo o sistema de salariato; que, em 99 por cento dos casos, os seus esforços para elevar os salários não são mais do que esforços destinados a manter de pé um dado valor do trabalho e que a necessidade de disputar o seu preço com o capitalista é inerente à situação em que o operário se vê colocado e que o obriga a vender-se a si mesmo como uma mercadoria. Se os operários, nos seus conflitos diários com o capital cedessem cobardemente ficariam, sem dúvida, desclassificados para empreender outros movimentos de maior envergadura.
Ao mesmo tempo e abstraindo totalmente a escravização geral que o sistema de salariato implica, a classe operária não deve ter grandes expectativas no resultado final destas lutas diárias. Não deve esquecer que luta contra os efeitos, mas não contra as causas desses efeitos; que consegue conter o movimento descendente, mas não fazê-lo mudar de direcção; que aplica paliativos, mas não cura a enfermidade. Não deve, portanto, deixar-se absorver exclusivamente por essas inevitáveis lutas de guerrilhas, provocadas continuamente pelos abusos incessantes do capital ou pelas flutuações do mercado. A classe operária deve saber que o sistema actual, mesmo com todas as misérias que lhe inflige, engendra simultaneamente as condições materiais e as formas sociais necessárias para uma reconstrução económica da sociedade. Em vez do lema conservador de: "Um salário justo por uma justa jornada de trabalho!", deverá inscrever na sua bandeira esta divisa revolucionária: "Abolição do sistema de trabalho assalariado!".
Depois desta exposição tão longa e, receio eu, fatigante, mas que julguei indispensável para esclarecer um pouco o nosso tema principal, vou concluir, propondo a aprovação da seguinte resolução:
1. – Uma subida geral da proporção dos salários no produto criado acarretaria uma baixa da taxa geral de lucro, mas não afectaria, de um modo geral, os preços das mercadorias.
2. – A tendência geral da produção capitalista não é para elevar o nível médio de salários, mas para reduzi-lo.
3. – Os sindicatos trabalham bem como centros de resistência contra as usurpações do capital. Fracassam, nalguns casos, por usar pouco inteligentemente a sua força. Mas, de modo geral, são deficientes por se limitarem a estabelecer um clima de guerrilha contra os efeitos do sistema existente, em vez de, ao mesmo tempo, se esforçarem para mudá-lo empregando as suas forças organizadas como alavanca para a emancipação final da classe operária, isto é, para a abolição definitiva do sistema de trabalho assalariado."
Karl Marx in Salário, Preço e Lucro