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PAÍS

Herança dos idosos para encher a pança aos burgueses do capital

Enquanto as heranças continuarem a crescer em número, extensão e proporção ao ponto de cobrir a terra dos afortunados, vão confrontar-se todas as famílias dos bem nascidos com as hordas dos despossuídos; famílias a crescer à custa de outras, frutos de berço de ouro, e do outro lado apenas quem tem os braços laboriosos e os seus filhos para ofertar. Esta sociedade capitalista é um lugar horrível em total estado de guerra, dos homens entre e contra os próprios homens.

O panorama é antigo. Este tema já é velho. Já cheira a mofo. Já ganhou pó. Já construíram teias. Já anda de bengala. Entretanto já morreu, porque o capitalismo o matou, destruiu, pisou e ignorou.

Vou poupar os nossos leitores para não ficarem sedentos de mais mortes, e para não ferir susceptibilidades.

Começo por dar conta das notícias mais frescas que circundam o mediatismo, que teimam em difundir para defraudar, e desafio o pasquim mais próximo a divulgar um artigo que seja do nosso jornal Luta Popular. O único jornal (desde 1971) que transmite as notícias sem florear, que vai ao cerne das questões, denuncia sem freio nem medo todo o tipo de situações, e valoriza acima de tudo quem trabalha e sai sempre em defesa da classe operária e de outros trabalhadores assalariados para juntos rumarmos a uma sociedade comunista.

Voltando ao nosso gasto assunto, vejamos as mais variadas notícias que estão em destaque nas capas dos jornais (nacionais ou regionais) e nas mais recentes pesquisas da internet.

•    “famílias gravam mensagens de natal para serem mostradas a familiares e idosos nas festas natalícias.” Isto é uma notícia bonita, uma iniciativa louvável que tem como principal objectivo atenuar as saudades e aproximar as pessoas. Mas não deixa de ser completamente desnecessária e promove o pão nosso de cada dia; distanciar as pessoas, cortar os afectos, servir a tecnologia e afastar a humanidade.
•    “calendário do advento solidário surpreende idosos com serenata.” Mais uma iniciativa para soltar alguns sorrisos, com distribuição de cabazes, recolha de alimentos para o banco alimentar contra a fome. Mas será que soltam as amarras? Findam as lágrimas que jazem durante o ano todo? Não! São mais uns gestos soltos sem resolver o problema, sem ir à raiz do mesmo. Pior, ajudam a disfarçar e a iludir e enchem os bolsos aos amigos.
•    “um morto em lar de idosos onde foram detectados 51 casos.” Este é mais um caso paradigmático da forma exagerada como foi conduzida toda a questão do vírus COVID-19. Esta vítima já estava acamada há muito tempo com patologias pulmonares associadas. Porque não temos estes casos como notícia de abertura dos telelixos?
•    “utentes de lar ilegal estiveram menos de 48 horas em centro de acolhimento.” Aqui assistimos a mais um caso de um lar ilegal, onde além de não existirem os cuidados mínimos, não existem também cuidadores suficientes. Não há dinheiro? Não há apoios? Ou pretendem ganhar mais dinheiro? E os apoios são desviados?
•    “lar de idosos, vai ter de implementar novas medidas para tentar controlar e estabilizar o surto.” Esta decisão foi tomada pela proteção civil municipal e pela autoridade de saúde que visitaram o lar e analisaram a situação. Seis idosos já foram encaminhados para o hospital. Estas decisões vão sendo tomadas às três pancadas. “Ora bem, estes vão porque há espaço, estes não porque não é necessário, estes vão porque estamos em época de eleições, estes não porque o sr. presidente da junta não deu ordem, estes vão porque vamos conseguir noticiar, estes não porque não valem a pena.” Alguém que se entenda! Mas como é possível, se os que mandam estão marimbando-se para isto tudo, nomeadamente para os idosos!

Falarei de seguida de dois casos.

Tenho uns tios num lar de idosos, que, além da doença, foram lá parar porque os filhos/irmãos não se entendiam. Ninguém queria ficar com eles, ou quando uns queriam, outro não queria. Curiosamente o que tem mais dinheiro e o primeiro a preocupar-se com a herança, pressionando e forçando até, e numa altura de maior debilidade, o meu tio a assinar junto do notário quem iria gerir as suas poupanças de uma vida. Que nojo! E nunca o foi visitar! Um biltre! Recentemente falei com o meu tio e com a minha tia, e vivem numa cultura do medo, medo das restrições e conformados e tristes com as regras impostas para a época natalícia. Com as suas rotinas e os seus dias contados, vão piorando em termos físicos e cognitivos porque estão condicionados e num ambiente claustrofóbico do ponto de vista humano, em clausura, impotentes, em casulos que não passam de lagartixas a borboletas. Deixam de voar. O lar vai fazendo o que pode no que respeita a dinamizar o dia dos seus utentes, mas eles estão nitidamente a morrer aos bocados e longe dos seus. Tantos filhos que não fazem a ponta de um corno, que abandonam à sua sorte os familiares, que os esquecem, que os empurram para lares e que nem os visitam na hora da morte. A minha tia teve COVID-19, mesmo tendo tido há uns anos um AVC e sofrer de problemas respiratórios, sobreviveu e está de vento em popa apesar de não haver água, nem ar. Mas é seu novo lar: amargo lar.

Outro caso: o lar betesda na Senhora da Hora, Porto. É uma instituição sem fins lucrativos… depois de conhecer e falar com algumas funcionárias percebi o seguinte: ganhavam o salário mínimo e trabalhavam mais do que oito horas por dia, no extenuante e deplorável horário por turnos, não permitindo exercer uma vida estável e regular; os utentes pagavam quantias exorbitantes, 800 euros por mês no mínimo; quando os alimentos de conhecidas cadeias alimentares tinham o prazo a findar, eram distribuídos para o lar os mais variados produtos, sendo que, como acumulavam, muitas das vezes eram dados aos idosos “fora do prazo” alimentos fora do prazo; quem fazia parte da administração do lar e controlava tudo eram “pessoas da igreja”, nomeadamente da igreja evangélica. Ah! Amém ao senhor! Vamos à igreja mas no fim das contas... crentes apenas na sua própria fé e na sua carteira.

Facilmente concluímos:

O Estado é um produto da sociedade de classes paralelo ao seu grau de desenvolvimento. A sociedade está enredada numa contradição sem remédio, e encontra-se dividida por antagonismos sem conciliação possível e não consegue de forma alguma reunir condições nem evitar problemas.

A esfera ontológica (que trata da natureza, do ser em si mesmo, da sua essência) na qual o homem está inserido enquanto ser social, é uma esfera fechada, amorfa, estagnada e decadente. O homem surge do reino animal e mantém-se um animal mesmo quando se socializa. Os homens tratam-se como bestas e feras, reduzidos às suas barreiras naturais, está totalmente alienado do género humano, da natureza; um ser espiritualmente destroçado, estraçalhado em termos cognitivos, arrasado e arruinado fisicamente, pauperizado socialmente.

A revolução comunista é a ruptura mais radical com o actual sistema de herança. A abolição da herança porá termo a este acossado regime de apropriação de bens e respectivamente apropriação de pessoas. A terra confere ao proprietário vivo o poder de atribuir a si próprio o trabalho de outros; o capital concede-lhe o poder de fazer o mesmo, sob o título de juros e lucro. E nesta esfera lucram os que tudo têm; esta esfera social é uma selva, onde por uma escolha de classe em detrimento do prazer pequeno-burguês, se revela nitidamente o inimigo, o bandido de fato e gravata, o saqueador bem falante.

O modo de produção capitalista corresponde a uma estrutura de classes, na qual a propriedade dos meios de produção determina a posição da burguesia como classe dominante. Assim sendo, tal como qualquer outra legislação burguesa, as leis sobre herança constituem não a causa, mas sim o efeito, a consequência jurídica da organização económica existente na propriedade privada dos meios de produção.

O desaparecimento do Direito de herança será o resultado natural de uma mudança social que suplantará a propriedade privada dos meios de produção.

Enquanto isto não for compreendido continuaremos caquéticos, sem dentes, mancos, decadentes, opróbrios, sem brio e embriagados de fel.

O capital urdiu aquilo que nós comunistas não desistiremos de desmontar!

Só assim mudaremos o paradigma da actual sociedade e só a instauração do modo de produção comunista tornará o homem pleno, livre e revolucionário, como disse um dos idosos que cedeu o seu gentil tempo para este artigo: “se eu fosse mais novo e soubesse o que sei hoje, arregaçava as mangas e ia para a luta, podem crer!”

22Dez2020

Benjamin

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