PAÍS
- Publicado em 14.05.2020
A Grande Farsa
Nos últimos dias, temos assistido à grande pantomima montada pelo primeiro ministro, António Costa, e pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, a que se juntou, no último acto o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Os três montaram um circo em volta do “empréstimo” de 850 milhões de euros previstos no orçamento de Estado, aprovado em Fevereiro, no Parlamento, sem votos contra, e promulgado em Março pelo presidente da República, portanto todos estavam cientes de tal transferência do erário público para o Fundo de Resolução, que por sua vez o transferiu para o Novo Banco, aliás, como acontece pelo terceiro ano consecutivo.
Contudo, em ano de pandemia, e consciente de que esta porá a nu a maior crise económica e financeira, com o despoletar de situações de exploração, desemprego, fome e miséria, Costa achou por bem tentar fazer crer aos portugueses – talvez para os apaziguar ou para gerar o tal clima de confiança de que tanto fala –, que está contra o pagamento do buraco financeiro do Novo Banco com dinheiros públicos e afirma com toda a confiança e desfaçatez que lhe é conhecida, que jamais entrarão no Novo Banco os 850 milhões de euros que já tinham entrado!
Ora, Costa conhece perfeitamente as condições em que ele e o seu governo, em 2017, venderam o Novo Banco ao Lone Star que detém 75% do banco (o Fundo de Resolução detém apenas 25%), cabendo-lhe fazer a gestão do banco. Também sabe que nesse contrato de venda, (preparado por Centeno), ficou estipulado um acordo de capitalização do Novo Banco pelo Fundo de Resolução (liderado pelo vice-governador do Banco de Portugal) que obriga o FdR a cobrir as perdas dos créditos problemáticos e que para isso foi criado o chamado mecanismo de capital contingente que obriga o FdR a injectar capital no NB, até 3,89 mil milhões de euros, sempre que seja necessário repor capital próprio para cumprimento dos rácios exigidos por Bruxelas, basicamente para colmatar as infinitas imparidades que não param de aparecer! (ver artigo do camarada sobre esta experiência financeira). Costa bem sabia que a auditoria pedida à Deloitte, para auditar o período de 2010 a 2018, não impediria a injecção dos 850 milhões de euros, tentando de forma desonesta apenas confundir a situação.
Que o Novo Banco seria um sorvedouro de dinheiro dos contribuintes já há muito que se sabe e foi nas páginas do Luta Popular que, logo a 15 de Abril de 2014, o camarada Arnaldo Matos denunciou num artigo seu – Banco de Portugal e BES: Quem Supervisiona o Supervisor? – o roubo perpretado pela quadrilha Espírito Santo, “denunciei a falência do BES e a responsabilidade do governador do Banco de Portugal nessa falência. Nesse mesmo artigo, denunciei também a Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública da Assembleia da República, que tinha o dever de supervisionar o governador do Banco de Portugal (BdP). E denunciei sobretudo os grupos parlamentares do PS, do BE e dos Verdes, por estarem a esconder a falência do BES, de que todos receberam dinheiro. E apertei o cerco ao governador Carlos Costa e aos partidos ditos de esquerda no Parlamento 2 anos antes de que alguém acordasse.” E todos andam por aí…
Portanto, desde 2014 que todos sabem o que é o Novo Banco, aquele que devia ser o banco bom, já que o lixo tinha ficado no banco mau…. E não, não podemos falar do Novo Banco sem falar da falência fraudulenta do BES e do GES, como Centeno tanto defende. Os leitores poderão consultar no nosso jornal o dossier Bes, assim como os vários artigos do camarada Arnaldo Matos, sobre esta matéria.
No segundo acto, Centeno, que inicialmente tenta deixar passar a posição de Costa, resumindo tudo a um problema de comunicação, revolta-se e tira o tapete a Costa, dizendo claramente que tanto Costa como todos os ministros sabiam da transferência dos 850 milhões de euros, aprovada em conselho de ministros, empurrando Costa para uma posição constrangedora, sem saída. Virou-se o feitiço contra o feiticeiro.
E o que dizer de Marcelo? Também ele, oportunisticamente, procurou em Costa o apoio que mais lhe convém . E, no meio de toda a comédia montada, anuncia, a partir de Costa, que se vai recandidatar!
No terceiro acto, assistimos a um autêntico volte face e tudo volta ao princípio. Costa e Centeno sorridentes saem da reunião como se nada tivesse acontecido, com Costa a comunicar ter confiança pessoal e política em Centeno, enquanto que o PR fala em equívocos, afinal nem queria interferir, etc…
Como é que é possível que três governantes, o presidente da República, o primeiro ministro e o ministro das Finanças se prestem a este tipo de jogos reveladores de mesquinhos interesses pessoais de carácteres indignos?
Centeno quer ser governador do Banco de Portugal e para isso precisa do apoio do governo; Costa precisa de Centeno no Eurogrupo e como ministro das Finanças, para apresentar o orçamento suplementar Marcelo, por sua vez, precisa de apoios para a sua nova candidatura e não lhe interessa uma crise política, que lhe dificultaria a vida.
Todos eles mostraram não terem condições, nem políticas, nem éticas para governar o país.
No fundo, neste jogo de interesses, todos estão reféns uns dos outros! É não ter vergonha na cara!
Esta comédia burlesca e indigna de governantes mostrou claramente que o povo não pode confiar nestes políticos e que se deve preparar para as lutas duras que vai ter de enfrentar.
14Mai2020
CG