EDITORIAL
Sem Papa na Língua…
Arnaldo Matos
Já toda a gente se terá dado conta de que o Papa Francisco, argentino nascido como Jorge Mario Bergoglio, ducentésimo sexagésimo sexto papa da Igreja Católica, Apostólica e Romana, está manifestamente muito longe de gozar do apoio dos órgãos de comunicação social do Mundo, nos termos em que dele gozaram os Papas anteriores, sobretudo desde o bondoso cardeal Roncali, denominado de Papa João XXIII.
Passam-se meses inteiros, sem que a imprensa, a rádio e a televisão do Planeta publiquem uma notícia, editem um comentário ou divulguem uma imagem sobre a vida e actividades de Francisco.
Chegou-se a pensar que o Homem já teria morrido e que o Vaticano escondera o caso. Um dia destes, o Homem aparece para aí morto como o nosso João XXI em Viterbo, por efeito de uma pedra autodespenhada pelo destino do alto da Catedral.
É óbvio que a direita religiosa, mundial e imperialista, não morre de amores por Bergoglio.
Todos os anos por esta quadra natalícia, os papas – e daí Francisco - enviam uma mensagem à Cúria Romana, que é o órgão de governo do Estado do Vaticano.
Na mensagem deste ano, a quarta do pontificado de Bergoglio, Francisco perdeu a calma e, à maneira do PCTP/MRPP, acusa uma assembleia de cardeais, de bispos e de outros responsáveis de traidores, por estarem a sabotar as reformas estruturais que o actual papa pretende introduzir na organização, missão e destinos da igreja.
Pelo quarto ano consecutivo, mas agora com maior veemência e mais decidida firmeza, Francisco ataca a Cúria, dominada por cardeais, bispos e padres italianos, por evidente boicote na aplicação das decisões do Santo Padre, considerando-a “um cancro que gera egoísmo e que se infiltra nos organismos eclesiásticos e nas pessoas que lá trabalham.”
Desde 2013, ano do conclave que o escolheu para Papa, Francisco vem tentando, sem grande sucesso, reformar a Cúria Romana, tornar a hierarquia católica mais próxima dos membros da igreja, assim como introduzir reformas financeiras e resolver escândalos de vária ordem que marcaram o papado do pastor alemão Bento XVI.
Bergoglio, nestes quatro anos, nem conseguiu levar à discussão, quanto mais resolvê-los, os escândalos financeiros e sexuais de altas figuras da Igreja, a questão do celibato religioso e o papel da mulher no seio da Igreja Católica.
Nestes campos, a Igreja Portuguesa tornou-se numa das mais reaccionárias do universo católico e afasta-se cada vez mais da linha progressista de apoio aos pobres do mundo e do combate ao capitalismo imperialista que frequentemente transpira das palavras e escritos de Bergoglio.
Na mensagem natalícia deste ano à Cúria, atacou directamente, muito embora sem os nomear, os que foram incumbidos de realizar as reformas, mas que “traíram a confiança”, ao “deixarem-se corromper por causa da ambição e da vã glória”.
E espetou-lhes em cheio uma faca no peito: quando são afastados, declaram-se erradamente mártires do sistema, em vez de admitirem que são traidores…
Na boca do Papa, palavras deste teor atestam a suma gravidade da crise por que passa a Igreja Católica Apostólica e Romana nos dias de hoje, com os seus mil e trezentos milhões de fiéis à procura de um novo rumo político, ideológico e teológico.
Estejamos atentos ao combate do Papa Francisco. Homem sem papa na língua. E vejamos qual o papel da cada vez mais reaccionária Igreja Portuguesa no combate conduzido por Bergoglio.
22Dez17