PAÍS
NAUFRÁGIO DO ARRASTÃO OLÍVIA RIBAU
Autoridade Marítima Nacional: Um Coio de Aldrabões
A História do Naufrágio e Salvamento Encenados em Sesimbra…
Nos dias 23 e 24 de Outubro, as grandes manchetes de todos os jornais diários e as notícias de abertura da rádio e da televisão andaram sempre à volta de um só tema: “Barco naufragado com 14 homens, todos pescadores entre os 40 e os 70 anos, tinham colete e escaparam ilesos”.
Toda a gente viu no país inteiro, mas sobretudo na Figueira da Foz, que aquelas notícias não passavam da propaganda do gato escondido com rabo de fora. O rabo do gato era aquela alusão final a que os 14 pescadores, com idades entre os 40 e os 70 anos, haviam escapado ilesos, porque tinham colete.
Isto era mais uma cobarde escarradela na face dos pescadores do Olívia Ribau mortos à entrada da barra da Figueira, dezassete dias antes, mortos por criminoso abandono das autoridades marítimas e não porque não envergassem coletes.
Todas as notícias da monumental campanha de propaganda sobre o naufrágio de Sesimbra fundavam-se, averiguados os factos, em três comunicados prontamente divulgados pela Lusa, provenientes da nossa já muito conhecida Autoridade Marítima Nacional: o primeiro, emitido às 08H10 do referido dia 23 de Outubro, com o título “Novo Naufrágio no mar, salvos 14 pescadores em Sesimbra”; o segundo, saído às 10H10 do mesmo dia, duas horas depois do primeiro, com o título “Novo Naufrágio no mar, salvos 14 pescadores em Sesimbra – actualização da informação”; e o terceiro, tornado público à mesma hora e no mesmo dia que o segundo (10H10), ostentava um título diferente, com vista a tentar limpar a má fama das congéneres da Figueira da Foz: “Estação Salva-vidas e Polícia Marítima efectuaram salvamento esta noite em Sesimbra”.
Estes comunicados da Autoridade Marítima Nacional nunca vêm assinados, como já se denunciou no caso dos comunicados respeitantes ao naufrágio do Olívia Ribau; e é mau, não só pela cobardia que o anonimato revela, mas também porque esconde o autor do analfabetismo e da iliteracia que gafam os aludidos comunicados.
Com efeito, será que o chefe do estado-maior da Armada não sabe que não há naufrágios em terra, para evitar o pleonasmo de escrever novo naufrágio no mar?
Estes solecismos gramaticais despertaram-me a curiosidade de saber quem é o oficial de Marinha analfabeto que é o autor dos comunicados da Autoridade Marítima Nacional, e, pelas diligências efectuadas, fiquei a saber que deverá ter sido o chefe de gabinete do chefe do estado-maior da Armada, um tal contra-almirante Gouveia e Melo, homem muito próximo da embaixada americana em Portugal, ao que consta.
Talvez fale melhor americano que português, mas, chamando Freud à psicanálise do caso, explica-se muito bem aquela tripla insistência no naufrágio no mar. É que não houve nenhum naufrágio em Sesimbra. O pseudo-naufrágio é uma encenação montada à volta de um inofensivo encalhamento. E encalhamento não é naufrágio, muito embora algum encalhamento possa ser causa de naufrágio.
Mas não foi o caso!
Façam o obséquio de ler o que na verdade se passou.É que o autor destas linhas, que tem sempre a coragem de assinar o que escreve, convencido que tal naufrágio no mar era uma aldrabice pegada da guerra psicológica da Autoridade Marítima Nacional contra os pescadores portugueses, a família dos mortos do Olívia Ribau e o protesto do povo da Figueira, foi a Setúbal, a Sesimbra, à Arrábida e a Tróia, tirou fotografias, falou com o mestre da traineira Segredos do Mar, pescador Manuel Piscaia, de 69 anos de idade, conhecido também por Manuel do Rapa, e está agora em condições de desmascarar os responsáveis da Autoridade Marítima Nacional pela encenação que montaram à volta daquela traineira e dos seus catorze pescadores.
Segredos do Mar é uma traineira da cooperativa Sesibal - Cooperativa de Pesca de Setúbal, Sesimbra e Sines CRL, com sede em Setúbal, registada sob a matrícula P-2059-C na praça de Peniche, construída em casco de madeira em 1989 pela empresa de construção naval Postiga & Teixeira, Lda., com 21,5 metros de comprimento e 42 toneladas de arqueação bruta.
Sem leme e com a proa da traineira apontada à costa, Mestre Manuel Piscaia reduziu a velocidade e, logo que lhe foi possível, engrenou a marcha à ré, deixando descair lentamente a traineira, com 14 pescadores a bordo, até conseguir um suave encalhe na Praia dos Penedos. Naquele local, protegido pela serra da Arrábida dos ventos do noroeste, o mar estava azeitado, não tendo corrido nem a embarcação nem os pescadores qualquer espécie de perigo.Na madrugada de 23 de Outubro, cerca das duas horas da manhã, depois de partir de Sesimbra e ainda antes de iniciar a faina da pesca da cavala, o sistema hidráulico do leme da traineira sofreu inopinadamente uma ruptura, bloqueando o rumo da embarcação e conduzindo-a directamente para a costa da Serra da Arrábida, no calhau de rocha rolada conhecido como a Praia dos Penedos.
A preocupação do Mestre Manuel Piscaia era comunicar com o armador e com as autoridades marítimas, para obter rebocador que safasse a traineira e a rebocasse para o porto mais próximo, o de Sesimbra, a pouco mais de uma milha marítima.
Por ter ficado sem rádio e na falta de rede para utilização do telemóvel, o alerta acabou por ser dado para o MRCC (Centro de Coordenação de Busca e Salvamento Marítimo) de Lisboa pela embarcação de pesca Jonas David, que se apercebeu das dificuldades em que se encontrava a traineira Segredos do Mar.
Dificuldades apenas de comunicação, com mar estanhado e sem vento, o que determinou que os 14 pescadores nunca abandonassem a embarcação, não acorressem a envergar coletes nem a movimentar a balsa.
A Segredos do Mar não naufragou nunca. Apenas encalhou suavemente de proa.
Não temos a certeza se o Almirante Manuel Macieira Fragoso, o ainda ministro Aguiar Branco e o contra-almirante Gouveia e Melo estarão ou não cientes do significado da palavra naufrágio. Mas para o caso de ignorarem o significado de uma palavra que todos os pescadores e homens do mar conhecem, eu reproduzo-lhes aqui o que dizem os três dicionários que tenho neste momento à mão.
O Dicionário da Língua Portuguesa, da Academia das Ciências de Lisboa, ensina que naufrágio é ir ao fundo uma embarcação; o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa diz que naufrágio é o afundamento de uma embarcação que sofre acidente; e o grande dicionário de Cândido Figueiredo regista que naufrágio é a perda de um navio que se afunda no mar ou se despedaça nas costas, baixios, etc.
Para haver naufrágio tem de haver afundamento ou despedaçamento da embarcação, no, mar claro…
Ora, não houve nenhum naufrágio em Sesimbra na noite de 23 de Outubro de 2015.
A traineira Segredos do Mar não naufragou mas apenas encalhou, e “a única coisa grave a evitar naquela emergência”, segundo as palavras por nós recolhidas do presidente da Cooperativa Sesibal, Ricardo Santos, “nunca se prendeu com a segurança dos homens, mas somente com os danos da embarcação a bater nas rochas”.
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