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EDITORIAL

É CASO PARA DIZER:

Enquanto o Funchal Ardia

Albuquerque Tocava Piano…

A História fala-nos no grande incêndio de Roma, que ocorreu na noite de 18 de Julho do ano 64 depois de Cristo, e algumas fontes atestam-nos mesmo que, enquanto o fogo consumia aquela que mais tarde ficaria conhecida como a Cidade Eterna, Nero contemplava o espectáculo tocando a sua lira…

O que ninguém acreditaria seria que 1952 anos depois, na noite de 8 de Agosto do ano 2016, a cidade do Funchal arderia, e o megalómano Miguel de Albuquerque, presidente do governo regional da Madeira, no meio do oceano Atlântico, tocava piano, enquanto contemplava o vale de lágrimas em que transformara o anfiteatro da capital do arquipélago.

Miguel teve uma primeira carreira como tocador de piano nas salas de baile dos hotéis da Madeira; teve uma segunda carreira como presidente da Câmara Municipal do Funchal; e estava agora no começo da terceira carreira, como presidente do governo regional do arquipélago.

Megalómano como é, Miguel de Albuquerque aproveitou a ameaça do incêndio que se adensava sobre a cidade, para convocar os órgãos de comunicação social da ilha e aí fazer render a sua conhecida megalomania.

E ali garantiu, erga omnes (perante todos), urbi et orbi (à cidade e ao mundo), às quatro horas da tarde, que o incêndio estava contido, sob controlo, e que todos podiam ir para casa, já não direi tocar piano como ele, mas ao menos descansar, que o nosso Nero local vigiaria por todos.

A primeira observação perante as palavras do megalómano pianista é esta: se um incêndio, digno de Nero, ameaçava o Funchal, mas estava totalmente controlado, podendo os funchalenses descansar em sossego, por que não foi o presidente da Câmara Municipal do Funchal, o Dr. Paulo Cafôfo, que efectivamente é o primeiro e único responsável político pelas ocorrências da cidade, a dirigir-se à população, através dos órgãos de comunicação social, e a sossegá-la perante ameaças tão aterradoras?

De onde vem ao presidente do governo regional, o megalómano pianista Miguel Albuquerque, poderes para substituir-se ao presidente da Câmara democraticamente eleito? E de onde vem ao nosso Nero atlântico as atribuições para rejeitar o auxílio oferecido pelo governo central da República e pelo governo regional dos Açores a uma Câmara Municipal da ilha, sem ouvir previamente o presidente camarário?

Afinal, quem manda e quem é responsável pela cidade e município do Funchal: Cafôfo ou Albuquerque? O professor ou o megalómano pianista das noites da Madeira?

Cafôfo não tem partido; o pianista é do PSD; Cafôfo foi eleito pelos cidadãos do Funchal, à frente de uma coligação democrática; o pianista foi eleito para o governo regional, por uma diferença de três votos, registados numa segunda e atribulada contagem, pela lista reaccionária e cripto-fascista do PSD.

Albuquerque quis aproveitar a oportunidade de uma tragédia eminente para brilhar e garantir segurança aos funchalenses. Espetou-se em todo o comprimento.

Uma hora depois de o pianista de hotéis ter rejeitado o auxílio do governo central e do governo regional açoriano e garantido, em nome da sua prosápia de inconsciente imbecil, que o Funchal não corria nem risco nem perigo, um incêndio dantesco tomara já conta da cidade e anfiteatro do Funchal, matara já quatro pessoas e incendiava mais de 300 habitações. Arderam casas, andares, prédios, fábricas, palheiros, chiqueiros e até hotéis inteiros, diante dos olhos de um povo incrédulo, que alguns momentos antes tinha acreditado na segurança prometida por um megalómano pianista de casinos, habituado a jogar à roleta com a vida e os bens dos outros.

Mentindo descaradamente sobre questões de segurança dos cidadãos, da qual aliás não percebe nada, Albuquerque desacreditou-se e desacreditou a Região.

Os turistas, alojados em hotéis esgotados, foram obrigados a deixar a Madeira, a cancelar as respectivas estadas de férias e a procurarem férias noutros destinos. É a ruína de toda a poderosa indústria turística madeirense.

Serão necessários mais de mil milhões de euros para recuperar a cidade do Funchal e o seu anfiteatro e fazer face aos prejuízos causados, a qual cidade nunca mais será igual ao que fora.

O meu amigo Doutor Raimundo Quintal, com quem e em companhia de muitos, andamos a plantar ervas e árvores nas serras interiores da ilha, a mais de 1 600 metros de altitude, como quem planta cabelos com uma sovela na cabeça de um careca, expressão do poeta Teixeira de Pascoaes, - enquanto eu ainda chorava pela destruição da minha cidade, mandou-me, para consolo e por amizade, este pequeno escrito, às três horas da madrugada da noite funesta:

“Eu e muitas centenas de funchalenses refugiámo-nos às 19 horas de ontem à beira-mar.

Pouco mais nos restou do que usar a mesma estratégia de Zarco e seus companheiros para não sermos apanhados pelo fogo tenebroso.

Quase seis séculos após o início do povoamento da Ilha da Madeira, continuamos pequeninos perante os elementos da natureza.”

Nas suas palavras, Raimundo Quintal ecoava um acontecimento descrito no Segundo Livro, das Saudades da Terra, do escritor seiscentista Gaspar Frutuoso, sobre o incêndio da Baía do Funchal pelos nautas de Gonçalves Zarco, e que reza assim:

“Daqui acordou o capitão, vendo que não se podia com trabalho dos homens desfazer tanto arvoredo, que estava nesta ilha des o começo do mundo ou da feitura dela, e para o consumir, para se lavrarem as terras e aproveitar-se delas, era necessário pôr-lhes fogo. E, como quer que com o muito arvoredo, pela muita antiguidade, estava dele derribado pelo chão e outro seco em pé, apegou fogo, de maneira neste vale do Funchal que era tão bravo que, quando ventava de sobre a terra, não se podia sofrer o abano e quentura dela, e muitas vezes se acolhia a gente aos ilhéus e aos navios até o tempo se mudar.”

Quintal, que é um lutador indómito, desta vez deixou-se dominar pelo sentimento, quando se viu forçado a confessar que “continuamos pequeninos perante os elementos da natureza.”

Mas aqui é que Raimundo Quintal se engana, quando decide convocar a nossa pequenez perante o fogo.

Refugiar-se à beira-mar, nos ilhéus e nos navios, como ensinou Zarco há seiscentos anos, é a resposta sábia de um grande capitão aos impetuosos elementos da natureza. Nenhum dos homens de Zarco morreu com o incêndio incontrolável, propositadamente ateado ao vale do Funchal.

Mas agora tudo foi diferente: não tinham um capitão, mas um reles pianista a brincar com o fogo, a garantir à população que não corria riscos nem perigos, que poderia estar descansada em frente da televisão, que ele, Albuquerque, velaria por todos, quando a população, olhando pela janela, via que o Funchal já estava a arder.

Quem, senão o megalómano Albuquerque, é responsável pela morte dos quatro desgraçados velhos que se deixaram ficar em casa, seguindo os conselhos do pianista?

Quem, senão o megalómano Albuquerque, é responsável pela verba de mil milhões de euros que será necessária para cobrir os prejuízos?

Quem, senão o megalómano Albuquerque, é responsável pelo crime de rejeitar o auxílio de Lisboa e dos Açores?

Mas há mais!

O incêndio incontrolável desencadeado pelos homens de Zarco foi-o num vale do Funchal coberto de árvores, muitas delas secas, que até existiam “des o começo do mundo e da ilha”. Mas este incêndio último liquidou o vale do Funchal quando ele já quase não tem árvores mas apenas construções caóticas, numa urbanização caótica, onde nem os bombeiros conseguem circular ou aceder.

O que os patos-bravos fizeram da cidade e anfiteatro do Funchal, em quase quarenta anos de jardinismo no governo regional e mais de vinte anos do pianista à frente da Câmara é que tornaram a minha bela cidade num paiol de incêndios e de explosivos.

As construções e o urbanismo dos patos-bravos de hoje ardem mais e melhor que a floresta da Laurissilva encontrada por Zarco e os seus homens, na Baía do Funchal.

Assim, resta juntar-me aos meus companheiros de jornada e voltar a plantar ervas, árvores e arbustos! A canalha jardinsita e albuquerquista destruiu a minha cidade. Eu vou-me vingar. E por muitos meios…

11.08.2016

 

Arnaldo Matos

 


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