PAÍS

GNR, TROPA DE OCUPAÇÃO DA MADEIRA?

grn da madeira 01A Guarda Nacional Republicana é, nos termos estatutários, uma força de segurança de natureza militar, constituída por militares organizados num corpo especial de tropas.

Não é pois uma polícia, mas uma tropa.

E é nessa função de corpo especial de tropas que tem sido despachada para zonas de guerra em Timor, no Afeganistão, no Iraque ou na Bósnia. O que veio então a GNR fazer para a Madeira?

A Guarda Nacional Republicana foi sempre mal vista e nunca tolerada na Madeira, não por ser republicana, que nunca o foi, mas por ser uma força de repressão abominável, como sempre o foi.

Por um curto período de três anos, a então recém-nascida Guarda Nacional Republicana estacionou na Madeira uma Companhia Independente – a nº 1 –, criada por um decreto de 10 de Maio de 1919, mas viu-se rapidamente escorraçada pela população madeirense e teve de retirar para Lisboa, com o rabo entre as pernas, em 1922.

Os Madeirenses nunca quiseram nem querem a GNR!

Oitenta e sete anos depois daquela experiência traumática, agora em 22 de Junho de 2009, a GNR voltou ao Funchal - pé ante pé, para não fazer barulho... - aparentemente com uma única missão expressa: exercer, na Região Autónoma da Madeira, as tarefas de prevenção e investigação de infracções fiscais, tributárias e aduaneiras da Guarda Fiscal, corpo de polícia entretanto extinto por integração na GNR.

Assim, em Portugal continental, a Guarda Fiscal integrou-se na GNR; mas, nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira, onde a GNR não existia, a GNR é que se integrou na Guarda Fiscal...

Ou seja: a GNR, além de pretender exercer nas regiões autónomas as tarefas únicas de prevenção e investigação fiscais, tributárias e aduaneiras, quer também passar a exercer nas regiões autónomas as missões que tinha e tem exclusivamente no território Continental.

A questão não é assim tão pouco importante como possa parecer às pessoas politicamente desatentas. É que a Madeira e os Açores são regiões politicamente autónomas. Mais ano menos ano, qualquer uma dessas regiões muito provavelmente reclamará para o exercício da sua autonomia as tarefas de prevenção e de fiscalização dos ilícitos fiscais, tributários e aduaneiros, pois não se compreende nem se aceita que a autonomia política regional não englobe também a autonomia fiscal, tanto mais que já dispõe de autonomia financeira. Nessa ocasião acabaria a Guarda Fiscal, se ainda existisse nas ilhas, mas nem por isso acabaria a GNR, a qual, às ocultas das massas populares mas bem à vista das pessoas mais argutas, vai procurando impor na Madeira e nos Açores as suas outras missões, essas unicamente continentais, ou seja, as suas missões de tropa de repressão e de ocupação.

Por outro lado, a Guarda Nacional Republicana, nos termos da sua lei orgânica, depende do membro do governo central responsável pela área da administração interna. Ora, nas regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, a área da administração interna está totalmente regionalizada no âmbito da autonomia política. Seria pois totalmente inadmissível que, depois de terem conquistado a sua autonomia política, os madeirenses e açorianos a vissem usurpada, através do indevido alargamento de poderes da GNR, pelo ministro da administração interna do governo central da República.

A GNR é uma agressão e uma usurpação da autonomia e, por isso, deve ser imediatamente expulsa dos territórios autónomos.

Tal é a exigência dos madeirenses e dos verdadeiros defensores da autonomia política da Madeira e dos Açores.

E não nos admiremos de que os pseudo-autonomistas do PSD local e Alberto João Jardim não digam uma única palavra contra a nova tropa de ocupação, porque, na verdade, para essa canalha, o que conta é ter mais uma boa tropa de choque para intimidar e reprimir a população.

Mas a GNR é, com efeito, um cavalo de Tróia introduzido dentro das muralhas da autonomia política regional. E, para todos os efeitos, a presença da GNR é, nas regiões autónomas, inteiramente anticonstitucional.

A GNR deve, pois, ser imediatamente retirada da Madeira e dos Açores.

Quando chegou à Madeira, em 2009, a GNR começou logo por constituir o seu Comando Territorial da Madeira, eliminando logo do nome político do arquipélago a designação de região autónoma, golpe de estado que ficou consagrado na própria lei orgânica da GNR. Para a Guarda, é já o seu território, muito embora para lá tenha sido mandada exclusivamente para efeitos de prevenção e investigação em inspecções fiscais, tributárias e aduaneiras.

Ainda antes de desembarcar na Madeira, a GNR já trazia, para além das competências que haviam pertencido à defunta Guarda Fiscal, as novíssimas missões de vigilância da costa e do mar territorial, funções que sempre pertenceram, na realidade, à Marinha...

E criou uma secção de protecção da natureza e do ambiente, tarefas que são da responsabilidade exclusiva do governo regional e que nenhum diploma constitucionalmente válido transferiu para a Guarda. Que vai ao ponto de se autorizar a prevenir e investigar os respectivos ilícitos contra a protecção e conservação da natureza e do ambiente.

Tudo isto constitui invasão inconstitucional e intolerável da autonomia regional.


E permite-se definir como missão própria a actuação em situação de flagrante delito em matérias de âmbito geral, o que invade não apenas competências de organismos regionais – PSP, Polícia Judiciária e Guarda-Florestal – como tem conduzido a conflitos com essas forças que já não é mais possível ocultar.

Os rictus que lhe sobraram do tempo do fascismo fazem com que a GNR defina a área que considera da sua responsabilidade do seguinte modo muito significativo:

A área (...) da RAM, com uma área terrestre de 805 km², uma costa de 260 km e uma área de 5800 km² (subentenda-se marítima) e uma população de 279 499 habitantes”!...

Que significará para a GNR a peregrina ideia de que tem responsabilidades sobre uma população de 279 499 almas? Significará que, para a GNR e seus comandos, a Madeira não tem cidadãos? Significa que a GNR se considera pastora de um rebanho de 279 499 carneiros? Já agora, será que também distingue entre carneiros pretos e brancos?

É preciso correr com esta corja, porque ela até já se considera dona de todos nós, imagine-se!...

Todos os anos, o Comando Territorial Independente da Madeira recruta novos militares para aumentar desmesurada e desproporcionadamente o efectivo do seu corpo de tropas de ocupação, o qual já vai em 181 indivíduos, para usar a expressão com que, nos seus autos, tratam os cidadãos.

Não há dia nenhum, nem sequer no dia de Natal, em que os tropas da GNR não procedam a operações stop na Madeira. Vêem-se mais gnrs nas ruas da Madeira do que em qualquer outra parte do País, se exceptuarmos, claro está, a concentração de gnrs que assassinou Catarina Eufémia nos campos do Alentejo.

No passado dia 22 de Junho, comemorando em parada diante do representante da República o seu quinto aniversário na Região, o comandante do posto territorial da GNR na Madeira, tenente-coronel Diamantino – que, como era da tradição nazi na escolha dos Gauleiter, não é natural do local ocupado – pedia mais 10 homens para acrescentar ao efectivo e aproveitou para distribuir a conhecida lataria comemorativa aos heróis da Guarda. Muito gostam os militares da GNR destas honras latoeiras...

Foi pena que o comandante Diamantino não se tenha dado ao incómodo de pôr os madeirenses ao corrente dos actos de heroísmo praticado pelos seus louvaminhados.

Mas nós talvez saibamos alguns dos motivos das condecorações dos rapazes:

 

 

  • • Será que foram louvados, por terem apreendido mais de um milhão de euros de mercadorias, no cômputo da qual apreensão se conta o roubo de 180 kgs de atum patudo aos 17 pescadores do atuneiro Falcão do Mar da praça do Caniçal?
     
  • • Será que foram condecorados porque fiscalizaram num só ano 70 000 veículos de transporte de mercadorias, o que significa que bisbilhotaram, em média, mais de duas vezes por ano cada uma das viaturas daquele tipo existente no arquipélago?
     
  • • Será que foram agraciados porque percorreram, nos carros do estado e com o combustível por nós pago, 320 mil quilómetros na caça à multa, uma distância que dava para ir da Madeira à Lua?
     
  • • Será que foram enlatoados por terem feito mais de 2 200 milhas náuticas atrás dos pescadores, distância que seria suficiente para ir quatro vezes a Lisboa?

 

 

A estratégia de alargar continuamente a sua área de actividade, invadindo e usurpando áreas de competência própria e exclusiva da autonomia regional, posta em prática pela GNR e respectivos comandos, deve ser implacavelmente combatida, porque constitui uma usurpação e uma afronta inadmissíveis aos campos políticos da autonomia.

Na comemoração do quinto aniversário da invasão da Madeira pela GNR, o Gauleiter Diamantino apontou mais uma das suas pretendidas áreas de extensão e usurpação de poderes:

A área de busca e salvamento, em particular o resgate em montanha, irá merecer uma atenção especial em termos de formação.

Esta declaração, feita numa ocasião em que estava ainda viva na consciência pública a morte de alguns estrangeiros que passeavam pelas levadas da Madeira, é um insulto gratuito aos bombeiros, guardas-florestais e homens e mulheres da protecção civil madeirense, que sempre têm sabido actuar com brio e com êxito no cumprimento dessas tarefas e não podem aceitar lições dos recém-chegados gnrs.

A GNR deve ser posta fora da Madeira e dos Açores. Assim o exige a autonomia política regional.



Espártaco