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PAÍS

Espírito Santo: Uma Quadrilha de Bandidos à Solta

4. Que solução para os problemas da falência do Grupo Espírito Santo e do Banco Espírito Santo?

O primeiro erro, grosseiro e grave, cometido simultaneamente pelo governo e pelos dois reguladores, foi o que consistiu em tentar separar, contra toda a lógica e até contra a sua própria natureza económica, o Grupo Espírito Santo e o Banco Espírito Santo, o GES e o BES. Isto mostra que, para aquelas três entidades, e à primeira vista, a questão devia ser tratada como o fora o problema da falência do BPN em relação à Sociedade Lusa de Negócios (SLN). É certo que, em ambos os casos, tanto a Sociedade Lusa de Negócios, como o Grupo Espírito Santo eram donos de um banco: a SLN, do BPN, e o GES do BES. Havia, porém, uma diferença radical: o BPN estava falido, mas a SLN, sua proprietária, não; e o BES estava falido, mas o GES também.

Assim, enquanto era teórica e financeiramente possível, separar o BPN da SLN, não era possível separar o BES do GES. Ora, o tempo que o governo e os reguladores perderam com esta falácia - separar o BES falido do também falido GES – foi o tempo que levou à implosão desses dois grupos de empresas ao desaparecimento do dinheiro do BES nas algibeiras da quadrilha de bandidos da família Espírito Santo.

Esta ficção obtusa, de que seria financeiramente sólido e economicamente apetecível um banco (o BES) que não passava de um simples activo falido de uma sociedade totalmente falida (o GES), levou à tragédia em que, desde o último domingo, está mergulhado todo o sistema financeiro e bancário português.

Sim, porque as coisas ainda mal começaram, e um futuro muito negro espera por Portugal…

O segundo erro, grosseiro e grave, do governo e dos dois reguladores foi o da monomania de insistir na solidez financeira do BES e na apetência da sua aquisição pelo capital privado. Esta estulta e estúpida mentira desabou como uma avalancha, quando o BES pretendeu reforçar o seu capital com a emissão em bolsa de 1,4 mil milhões de euros em novas acções. Em dois dias, as acções estavam à venda por 10 cêntimos cada uma, com uma desvalorização relâmpago de 90% em menos de 24 horas, que ia levando à falência bolsista não apenas todos os bancos portugueses, como a maior parte das sociedades do nosso PSI20.

Foi então que toda a gente viu, claramente visto, aquilo que tenho vindo a denunciar há muitos anos: que não temos em Portugal um único economista político que preste.

Em pânico e aterrorizados, o primeiro-ministro, a ministra das finanças, o governo, o presidente da República e respectivos conselheiros, depois de consultada a tróica e todos abraçados ao regulador Costa, desencadearam, entre quinta-feira e domingo, de 31 de Julho para 3 de Agosto, um golpe-de-estado legislativo contra a Constituição, contra a Assembleia da República e contra o povo português, aprovando, promulgando e referendando um pacote de diplomas legais, para que não tinham as respectivas competências, publicando alguns deles pela calada da noite e até nunca publicando alguns outros, mediante o qual pacote legislativo, que nenhum representante do povo português pôde estudar, conhecer ou autorizar, destruíram um banco que todos haviam jurado, até à véspera do golpe, como financeiramente sólido e economicamente apetitoso, dividiram o banco em dois bancos, sem consultar um único accionista e ainda menos os respectivos conselho de administração ou assembleia geral, baptizaram um dos bancos de Novo Banco – no que revelaram uma imaginação filológica prodigiosa, pois de certo não haverá nada de mais novo do que aquilo que acaba de nascer!... – chamaram ao outro banco de velho e de BES, - aqui na realidade se comprova que esgotaram toda a imaginação na designação do primeiro banco -, e entregaram ao Novo Banco tudo o que era velho mas que cheirava poder dar dinheiro (activos, depósitos, propriedades, sede, delegações, trabalhadores e administração do Bento careca), e ao velho banco – o BES – tudo o que suspeitavam não valer nada, como as acções, os accionistas, e todos os produtos financeiros designados de tóxicos.

A canalha que levou a cabo este golpe-de-estado nem imagina sequer na alhada em que se meteu e meteu o país, mas a realidade é que pode vir a pôr em causa e imediatamente todo o sistema financeiro e bancário português e pode arrastar Portugal para uma demanda litigiosa internacional, sem fim à vista e de despesas absolutamente incalculáveis.

Note-se que o BES, muito embora falido, não passa de um simples activo de uma holding luxemburguesa que pediu protecção contra os credores no tribunal de comércio do Grão-Ducado, e está em vias de ser declarada insolvente. Claro está que, ao esvaziar o BES de recursos, os credores da sociedade luxemburguesa, Espírito Santo Financial Group (ESFG) não vão aceitar o actual BES, nascido do golpe-de-estado legislativo, esvaziado da parte valiosa que foi unilateralmente conferida ao Novo Banco. Nem os accionistas, que são donos de um banco que, muito embora falido, tem todavia um activo e um passivo, irão aceitar ficar com um banco que lhes confiscou o activo, deixando-lhes apenas o passivo para pagarem.

Os autores do golpe-de-estado de 31.07 a 03.08 de 2014, ou não tiveram presente no espírito ou não quiseram extrair todas as conclusões da composição accionista do BES na ocasião do golpe, estrutura accionista essa que aqui se deixa projectada, para melhor compreensão do assunto:

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Ora, os accionistas estrangeiros conhecidos são os seguintes: Espírito Santo Financial Group, (20,1%), Crédit Agricole (14,6%), Bradesco (3,9%), Capital Research (4,2%), BlackRock (4,7%), Baros (2,01%) e Silchester (4,7%), os quais, tudo somado, são donos de 54,62% do capital do BES.

Como é que o supervisor Carlos Costa tenciona, sem ter de afrontar uma litigância processual que afundará ainda mais o défice das nossas finanças públicas, confiscar aquele parte maioritária e estrangeira do capital do BES?

Para resolver o problema da insolvência do BES, mas não da falência do GES, existia já no ordenamento jurídico português um diploma – a Lei nº1/2014, de 16 de Janeiro- -designado por lei de recapitalização bancária, que permitia ao Estado português recapitalizar com dinheiros públicos os bancos em vias de insolvência, assumindo o Estado o lugar e o papel de accionista, na proporção do capital público injectado. Com ligeiras diferenças em cada um dos casos concretos, foi esse o esquema utilizado na recapitalização do BCP, do BPI, do Banif e da CGD, a qual aqui se cita sem olvidar que já é um banco público. Os dinheiros públicos utilizados nesses casos provieram, como se sabe, de um fundo de 12 mil milhões de euros, disponibilizados pela tróica.

Recorde-se que o BPI, para se ver livre do Estado no controlo da administração do banco e para poupar no pagamento de juros, acaba de pagar, com grande antecedência, o capital público que havia recebido, e que o BES, claramente para evitar o controlo directo da administração do banco pelo indesejado sócio Estado, recusou a oportunidade de recapitalizar-se em 2012, agora sabe-se que para ocultar ao Estado os esquemas de financiamento fraudulento das empresas do Grupo Espírito Santo pelo seu banco de retalho.

Parece que foi Draghi e o Banco Central Europeu, a partir de Franqueforte (como se ouve dizer nos relatos de futebol...), que impuseram ao governo de traição nacional Coelho/Portas, ao paspalho do presidente da República e ao pau-mandado do supervisor Carlos Costa do BdP, o golpe-de-estado legislativo que substituíu, contra a Constituição, contra a Assembleia da República e contra o povo português, a Lei nº1/2014, de 16 de Janeiro, por um calhamaço de mais de duzentos artigos, intitulado Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado na longa noite das facas longas, que decorreu clandestinamente, entre Belém e São Bento, de 31 de Julho a 3 de Agosto.

Assim, em vez da recapitalização bancária em que o Estado recapitalizante assumia a qualidade accionista e de administrador do banco recapitalizado, o Banco de Portugal impôs clandestinamente um novo sistema, aplicado à experiência e pela primeira vez em Portugal, chamado de Resolução Bancária.

A resolução bancária é o sistema com que, mediante capitais públicos e à custa do contribuinte, se reprivatiza um banco privado falido!...

Sucede que, também em 15 de Abril passado – nesse mesmo dia em que aqui publiquei aquela notícia da falência do BES com quase quatro meses de antecedência sobre o seu estouro definitivo – trouxe aos meus leitores um outro escrito, desta feita intitulado Como Votam os Traidores em Bruxelas e Estrasburgo?, no qual dava conta da actividade frenética da eurodeputada do PS Elisa Ferreira, para fazer aprovar, na noite (Ah!, porque será que os traidores fazem tudo na clandestinidade e de noite?!) de 14 de Abril, última sessão do Parlamente Europeu, antes de encerrar para férias e para o novo acto eleitoral, um diploma sobre a União Bancária na Europa, designado de Mecanismo Único de Resolução dos Bancos e Instrumento de Resgate Interno, pelos quais mecanismo e instrumento o Banco Central Europeu e o imperialismo bosche passariam a controlar todo o sistema bancário e todos os bancos da União Europeia.

Ora, foram precisamente esses mecanismo e instrumento únicos de restauração dos bancos em toda a Europa – que, apesar de aprovados no Parlamento Europeu, ainda não entraram em vigor na União, desde logo porque não foram ainda aprovados nos parlamentos nacionais e porque não se acham ainda constituídos os fundos europeus de resolução bancária e de garantia de depósitos - foram precisamente esses mecanismo e instrumento que no golpe-de-estado nocturno de 31.07 a 03.08 de 2014, foram impostos ao povo português. Só que, em Portugal, não havia, até à data do golpe-de-estado e em boa verdade até hoje, nenhum fundo de resolução bancária, constituído por contribuições de bancos, e o fundo de garantia de depósitos, actualmente no montante de 1,49 mil milhões de euros, não assegura o resgate, no valor de 100.0000 euros, por cada depositante do BES (que tem 38 mil milhões de euros de depósitos, sem todavia ter revelado até hoje o número dos seus depositantes) quanto mais o resgate de todos os depositantes de todo o sistema bancário nacional (117,411 mil milhões de euros de depósitos) todos garantidos por aquele exiguíssimo e ridículo fundo de 1,49 mil milhões de euros.

E, por outro lado, como não havia nenhum fundo de resolução bancária constituído por participações dos bancos, o fundo, que devia ser totalmente privado e de âmbito europeu, vai ser unicamente constituído pelos 4,9 mil milhões de euros provenientes do erário público, verba que sobrou do fundo inicial da tróica para a recapitalização bancária, no montante de 12 mil milhões.

Pelo golpe-de-estado legislativo da noite das facas longas, Portugal foi obrigado a servir de cobaia do mecanismo de resolução bancária, que ainda não está em vigor no espaço da União Europeia. Os imperialistas europeus exultaram com este papel de cobaia a que sempre estão dispostos os traidores que nos governam. O Le Monde, actualmente engraxador dos sapatos de Monsieur Hollande, no editorial do director, saído em 6 de Agosto, sobre o título interessante e muito significativo A União Bancária Experimentada em Portugal, escreve esta prosa que nos deveria fazer morrer de ultraje e de vergonha:

É uma boa notícia para a zona euro. Após um mês de turbulências nos mercados e do temor de contágio ao resto da economia, o governo português decidiu-se, domingo dia 3 de Agosto, a ajudar o Banco Espírito Santo em dificuldades. O plano de salvação foi aplicado em 48 horas. Os accionistas e credores não prioritários vão ter que meter as mãos nos bolsos, enquanto que os depositantes e contribuintes são poupados. Para o obter, Lisboa seguiu escrupulosamente as regras que a zona euro tentará aplicar depois da crise. A união bancária logrou a primeira prova à escala natural, e devemo-nos todos felicitar pelo caminho percorrido desde 2010”.

A verdade é que Le Monde, para exorcizar terrores próprios, deita foguetes antes do tempo. Na realidade, não há nada que nos garanta que a cobaia portuguesa não irá sair completamente pelada desta experiência surrealista, para que foi empurrada a partir de Franqueforte.

Se não, vejamos! 

A quanto é que monta o fundo de resolução para resgatar o BES? O supervisor, sob a gestão do qual correrão todas as operações daqui para o futuro, fala em 4,9 mil milhões de euros, 4,5 mil milhões dos quais injectados pelo erário público. Para saber se o montante desse dinheiro será suficiente para resgatar o BES, terão de se conhecer dois parâmetros: qual é o défice actual do BES e em quanto tempo se propõe o regulador absorver esse défice.
Ora, sobre este dois parâmetros, o supervisor, que não parece abundar muito em inteligência, não disse uma palavra até hoje.

Nos termos do relatório e contas do BES apresentado já pela administração de Vítor Bento, o prejuízo do banco da família Espírito Santo no primeiro semestre de actividade deste ano subia a 3,577 mil milhões de euros. Sendo esta uma verba absolutamente incomensurável e nunca alcançada por nenhuma entidade bancária ou financeira portuguesa, nada garante que o prejuízo do BES não seja muitíssimo superior ao prejuízo agora admitido.

Suponhamos que, na linguagem do Barredo que caracteriza o supervisor Costa, o Novo Banco ficará com a parte boa do BES e o BES com a parte má de si mesmo. Consultemos então a conta do balanço consolidado do BES relativa ao primeiro semestre de 2014, última conta que existe publicada, e da autoria da administração do Vítor careca.

Passará para o Novo Banco o activo, assim constituído:

novobancoactivos

Deste activo, quanto logrará o Novo Banco cobrar? Das aplicações financeiras e do crédito a clientes, no montante de 71 mil milhões de euros, em números redondos, o Novo Banco poderá não deitar a mão a um único cêntimo, atendendo às falências das empresas do GES, elas mesmas devedoras ao banco, e dos bancos do próprio BES, e à época de crise em que vivemos, com o crédito mal parado a atingir nos nossos bancos rácios da ordem dos 30%.

Se o Novo Banco alcançar um terço do seu crédito a clientes e das suas aplicações financeiras – e não há garantias de que o alcance – o activo acima descrito perderá a quantia de 48 mil milhões de euros, em números redondos. E nem nos preocuparemos com as outras rubricas do activo, porque o Novo Banco, quanto à maior parte delas, não arranjará maneira de as cobrar.

O activo ficará assim reduzido a 34 mil milhões de euros, se não a menos ainda.

No balanço consolidado apresentado pela administração de Vítor Bento, vêm descritas no passivo do BES as seguintes verbas:

novobancopassivo

Deste passivo, passará para o Novo Banco pelo menos os empréstimos contraídos junto do Banco Central Europeu (8 613 740), os recursos, isto é, os depósitos de clientes (36 685 238), as provisões (3 357 099), e os empréstimos seniores que não se conhece a quanto montarão no global de 24 354 500 euros. Admitindo que do passivo passará para ao Novo Banco o mínimo possível, e deixando de parte o montante desconhecido dos empréstimos sénior, tudo coisas que o nosso sábio supervisor descarta esclarecer, então haverão de passar, no mínimo, 47 mil milhões de euros, em números redondos.

Em síntese, até que Carlos Costa esclareça, como lhe cumpre, definitivamente o que passa e o que não passa do velho BES para o Novo Banco, nós podemos concluir, com absoluta segurança, que passará um activo no montante de 34 mil milhões de euros e um passivo de 48 mil milhões de euros, tudo números redondos.

O Novo Banco começa assim a viver com um prejuízo de 3,577 mil milhões de euros e um défice de 15 mil milhões de euros. Os 4,9 mil milhões de euros que atestam o chamado fundo português de resolução bancária não chegam, de maneira nenhuma, para recuperar o BES. É preciso pôr lá 20 mil milhões de euros!

Por mais que queira fazer-se passar por parvo, o supervisor Carlos Costa pode pedir a alguém, no Banco de Portugal, que lhe calcule com correcção, como aqui se faz, o montante que há-de constituir o fundo de resolução do BES. Ele próprio, supervisor, saberá – e não se vê por que é que o oculta – que precisa desses 20 mil milhões de euros para o efeito.

E onde é que os vai ele buscar? Irá buscá-los aos depósitos dos clientes, como o Banco Central Europeu já mandou fazer, há dois anos – a partir de Franqueforte!... -, no banco de Chipre. Ora, no BES – e no Novo Banco – os depósitos dos clientes montam, como já se viu, a 37 mil milhões de euros; por isso aqui fica, estimado leitor, o meu conselho veemente e urgente aos depositantes do BES, cujas contas irão agora transitar para o Novo Banco:

LEVANTEM IMEDIATAMENTE OS VOSSOS DEPÓSITOS NO NOVO BANCO, PORQUE, MAIS DIA MENOS DIA, VÃO FICAR SEM ELES, COMO JÁ SUCEDEU COM OS DEPÓSITOS NO BANCO DE CHIPRE!

E notem que, dada a exiguidade ridícula do Fundo de Garantia de Depósitos português (1,49 mil milhões de euros, como se deixou supra-referido), nem quanto à propalada garantia dos 100 mil euros por depósito se pode acreditar nela.

As medidas agora postas em prática, mediante um verdadeiro golpe-de-estado, pelo governo de traição nacional Coelho/Portas, pelo espantalho de Belém e pelo supervisor Carlos Costa, vão roubar os depositantes do BES, vão aumentar em 20 mil milhões de euros a nossa dívida pública e acarretarão mais austeridade, mais roubo no trabalho e no salário, mais corte nas pensões e nas reformas, mais emigração, mais fome, e mais miséria.

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Comentários   

 
# apolíneo gouveia 13-09-2014 13:42
A informação cheira toda ela a coisa escorreita, verdadeira e limpa .Foi uma lição que recebi por um grande professor ( Espartaco ) Preciso de acompanhar estas lições no futuro . Estou colado
 
 
# apolíneo gouveia 13-09-2014 14:45
muito util esta peça !
 

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