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PAÍS

QUANTOS ANOS TEM A LÍNGUA PORTUGUESA?

Por iniciativa do deputado Ribeiro e Castro, do CDS/PP, e subscrito por inúmeros académicos da língua, literatura e cultura portuguesas das universidades dos países da lusofonia, conjuntamente com o presidente da República de Cabo Verde, o presidente e o primeiro-ministro da República de Timor Leste, o chefe da missão de Angola junto da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), o embaixador de Moçambique em Portugal, o secretário executivo da CPLP e o presidente do Instituto Internacional de Macau, e também por alguns escritores da nossa língua, vai ser proclamado hoje o Manifesto 2014, para celebrar os oitocentos anos da Língua Portuguesa.

Resolvi exprimir a minha oposição política ao Manifesto 2014, reproduzindo-o aqui integralmente, porque o manifesto, sendo embora um bom hino à língua portuguesa, falha quanto à questão da data e quanto à escolha do documento fundador.

 

 

 

 

 

 

Manifesto 2014

A língua que falamos não é apenas comunicação ou forma de fazer um negócio. Também é. Mas é muito mais. É uma forma de sentir e de lembrar; um registo, arca de muitas memórias; um modo de pensar, uma maneira de ser – e de dizer. É espaço de cultura, mar de muitas culturas, um traço de união, uma ligação. É passado e é futuro; é história. É poesia e discurso, sussurro e murmúrios, segredos, gritaria, declamação, conversa, bate-papo, discussão e debate, palestra, comércio, conto e romance, imagem, filosofia, ensaio, ciência, oração, música e canção, até silêncio. É um abraço. É raiz e é caminho. É horizonte, passado e destino.

Na era da globalização, falar português, uma das grandes línguas globais do planeta, que partilha e põe em comum culturas da Europa, das Américas, de África e da Ásia e Oceânia, com centenas de milhões de falantes em todos os continentes, é um imenso património e um poderoso veículo de união e progresso.

Em 27 de Junho de 2014, passam oitocentos anos sobre o mais antigo documento oficial conhecido em língua portuguesa, a nível de Estado – o mais antigo documento régio na nossa língua, o testamento do terceiro rei de Portugal, Dom Afonso II.

Neste dia, queremos festejar esses oito séculos da nossa língua, a língua do mar, a língua da gente, uma grande língua da globalização. Fazêmo-lo centrados nesse dia e ao longo de um ano, para festejar com o mundo inteiro esta nossa língua: a terceira língua do Ocidente, uma língua em crescimento em todos os continentes, uma das mais faladas do mundo, a língua mais usada no Hemisfério Sul. Celebramos o futuro. Em qualquer lugar onde se fala Português.

27 de Junho de 2014

 

 

 

 

 

 

Como se verifica, o manifesto assenta na ideia de que em 27 de Junho de 2014 – no dia de hoje, portanto – passarão oitocentos anos sobre a data do mais antigo documento oficial conhecido em língua portuguesa: o testamento de D. Afonso II, o Gordo, terceiro rei de Portugal.

Porquê o mais antigo documento oficial, e não o mais antigo documento tout court, oficial ou não? Porque os mais antigos documentos escritos em língua portuguesa são documentos de proveniência popular e não de proveniência real!...

Vejamos as coisas como elas são!

Até hoje, foram encontrados dois exemplares deste testamento, ambos cópias de um original jamais encontrado: a cópia que foi enviada ao arcebispo de Braga e a que foi remetida ao arcebispo de Santiago. Ambas as cópias estão datadas do ano de 1214, mas nenhuma delas contém a indicação do dia e do mês. Mesmo a cópia, em latim, enviado ao arcebispo de Toledo, não contém a indicação do dia e do mês da outorga do testamento real.

A data completa – 27 de Junho de 1214 – que a hermenêutica portuguesa atribui ao testamento está longe de poder considerar-se definitiva quanto ao dia e quanto ao mês, embora certa quanto ao ano.

Com segurança, não é possível afirmar, como pretende o manifesto acima transcrito, que faz hoje oitocentos anos o mais antigo documento oficial escrito em português. Fará oitocentos anos este ano o testamento do rei, mas existe ainda um elevado grau de incerteza quanto ao dia e quanto ao mês.

Para satisfação de eventual curiosidade do leitor, transcrever-se-ão três linhas do testamento de D. Afonso II, primeiramente no português arcaico de 1214, depois, no português moderno de hoje. O texto do testamento encontra-se na Torre do Tombo, em Portugal.

 

 

 

 

 

Testamento, no português arcaico de 1214

En'o nome de Deus. Eu rei don Afonso pela gracia de Deus rei de Portugal, seendo sano e saluo, temëte o dia de mia morte, a saude de mia alma e a proe de mia molier raina dona Orraca e de me(us) filios e de me(us) uassalos e de todo meu reino fiz mia mãda p(er) q(ue) de pos mia morte mia molier e me(us) filios e meu reino e me(us) uassalos e todas aq(ue)las cousas q(ue) De(us) mi deu en poder sten en paz e en folgãcia. P(ri)meiram(en)te mãdo q(ue) meu filio infante don Sancho q(ue) ei da raina dona Orraca agia meu reino enteg(ra)m(en)te e en paz.

E ssi este for morto sen semmel, o maior filio q(ue) ouuer da raina dona Orraca agia o reino entegram(en)te e en paz. E ssi filio barõ nõ ouuermos, a maior filia q(ue) ouuuermos agia'o ...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Testamento, no português moderno de 2014

Em nome de Deus. Eu, rei D. Afonso, pela graça de Deus, rei de Portugal estando são e salvo, temendo o dia da minha morte, para a salvação da minha alma e para proveito de minha mulher D. Urraca e de meus filhos e de meus vassalos e de todo o meu reino, fiz meu testamento para que depois de minha morte, minha mulher e meus filhos e meu reino e meus vassalos e todas aquelas coisas que Deus me deu para governar estejam em paz e em tranquilidade. Primeiramente mando que o meu filho D. Sancho, que tenho da Rainha D. Urraca assuma o meu reino inteiramente e em paz. E se não tivermos filho homem, a filha mais velha que tivermos,

 

 

 

 

 

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